Segundo o economista, a emigração deixou de ser uma viagem sem regresso e passou a ser, para muitos jovens, uma experiência temporária. “Há sempre amigos que já viveram e trabalharam no estrangeiro e decidiram regressar”, observa.

Mas o fenómeno que destaca o ex-ministro da Economia é outro: Portugal tornou-se também um destino para jovens qualificados vindos de países ricos, como Alemanha, França, Itália, EUA ou Reino Unido. Desde 2019, afirma Caldeira Cabral, o número destes jovens que vêm trabalhar para Portugal supera o número de portugueses que emigram para os mesmos países.

Dados recentes mostram que entram anualmente no país cerca de 45 mil estrangeiros oriundos de economias com salários superiores aos portugueses, dos quais 33 mil são cidadãos da União Europeia. Só no último ano, cinco mil norte-americanos, seis mil italianos, quase quatro mil alemães e número semelhante de franceses pediram residência permanente em Portugal, a maioria com menos de 45 anos.

A ideia de que Portugal vive uma fuga de talentos não resiste aos números, argumenta Caldeira Cabral. O professor da UMinho sublinha que, embora tenham aumentado as qualificações dos jovens que emigraram, cresceram ainda mais as qualificações dos jovens que permaneceram no país.

Citando o Boletim Económico do Banco de Portugal, o autor explica que, entre os jovens que emigraram, 30% têm ensino superior, mas entre os que ficaram essa proporção chega aos 38,5%. “A propensão a emigrar é menor entre os mais qualificados, exatamente o contrário da fuga de cérebros”, afirma.

O saldo global também joga a favor de Portugal: nos últimos quatro anos, o emprego de licenciados cresceu 320 mil, enquanto o sistema de ensino superior formou apenas 230 mil. “A diferença, cerca de 90 mil, só pode ser explicada pela imigração qualificada”, sustenta. No mesmo período, terão saído entre 40 e 50 mil licenciados, mas entraram entre 150 e 160 mil.

Para Caldeira Cabral, estes dados demonstram que Portugal deixou de encaixar no modelo clássico de migração “Norte-Sul”, em que trabalhadores se deslocam apenas dos países mais pobres para os mais ricos. O país aproxima-se agora do padrão “Norte-Norte”, típico das migrações dentro da UE: fluxos nos dois sentidos, com saída e entrada de trabalhadores qualificados.

O professor afirma que esta mudança obriga a repensar o debate sobre a emigração jovem. “Se os jovens saem apenas porque os salários são maiores lá fora, como explicar que tantos estejam a voltar?”, questiona. E acrescenta: “Se Portugal não tivesse oportunidades interessantes, porque estaria a atrair jovens da Alemanha, França, Itália ou EUA?”

Entre 2020 e 2023, regressaram ao país mais portugueses do que aqueles que partiram. Só no último ano, 31 mil cidadãos nascidos em Portugal voltaram, a maioria jovens trabalhadores. Para o ex-ministro, esta tendência deve ser encarada como uma oportunidade: “Temos de olhar para os nossos jovens emigrantes não como uma perda, mas como uma força estratégica”, defende, sugerindo que o país os mobilize como “embaixadores” e valorize a experiência internacional que trazem.

Caldeira Cabral recorda ainda que países como Luxemburgo, Irlanda ou Suíça têm taxas de emigração jovem superiores à média europeia, e isso não significa decadência, mas abertura ao mundo. O mesmo, afirma, deve aplicar-se a Portugal.

Com o aumento do número de regressos e a capacidade de atrair talento estrangeiro, o autor defende que Portugal deve abandonar a visão fatalista sobre emigração. “Não devemos ficar a chorar o leite derramado dos que escolhem sair, porque muitos vão mais tarde escolher voltar”, escreve.

A prioridade, conclui, deve ser manter incentivos e criar condições para que regressar a Portugal se torne vantajoso, para os jovens e para o país.

By VO